ENCARNADO
PERFORMANCE e INSTALAÇÃO
PERFORMANCE e INSTALAÇÃO
Aproximando-me de Ourique em presença
desperta, com olhos e corpo, conversas com pessoas e lugares, pude visitar
paisagens e narrativas. Na duração desses três meses em mergulho sem hesitar,
acreditando na potência do encontrar, pude acessar tempos seculares de um
Portugal muito antigo. Sigo tocada pela poesia de Ourique, volto ao Brasil
levando os encontros que vivi, a poesia deste Alentejo profundo.
Encarnado surgiu de questões que me
assolavam o pensamento e o espírito no difícil ano de 2012, vivendo e
trabalhando em São Paulo. Por que o Brasil é um país feito da completa
diversidade de pessoas, sem um mito de origem que dê conta de explicar como
chegamos aqui e convivemos com uma exclusão social atroz e violenta? Por que
somos alegres e cultivamos o espírito da festa se vivemos numa sociedade
desastrosa, mergulhados numa política ineficiente? Como chegamos nessa
situação?
Na busca de respostas encontrei o
pensamento do sociólogo e psicólogo Roberto Gambini e sua abordagem sobre o
mito de origem do Brasil, sua releitura das cartas dos escrivães portugueses
que aqui chegaram no século XVI. Como viram e descreveram o que aqui existia e
como se deu este encontro entre parcelas distintas e opostas da humanidade: o
expansionismo buscando riqueza econômica e o aborígene ligado a terra, numa relação
simbiótica com a natureza, O olhar dos portugueses para o indígena nu,
integrado em sociedades sem estrutura de poder evidente, nem propriedade
privada. O ambiente natural com clima privilegiado e ameno despertou uma alusão
ao paraíso bíblico do homem puro que desfruta sem esforço a riqueza da terra.
Estar em Lisboa em 2013 vivendo o
encontro com pessoas e lugares em longas caminhadas pela cidade, estabelecendo
mapas geográficos e afetivos, exercitando a escuta em diálogo, contatando
narrativas e paisagens, sofri um impacto. No contato com as pessoas, eram-me
devolvidos todos os clichês de ser brasileira mas, depois de passada a primeira camada, percebia o
temperamento saudoso e o queixume na relação com o trabalho. A projeção do desejo sobre o corpo da
mulher brasileira em Lisboa também me aproximou de Gambini, pela sua abordagem
da sexualidadde dos indígenas do ponto de vista dos portugueses.
A residência em Ourique, no Alentejo
melancólico e poético, reverberando o trabalho ligado à terra e à criação de
animais, me fez ouvir outras vibrações. Conheci uma cultura mais antiga, anterior
ao mercantilismo do século XVI. Quero voltar, retornar às pessoas em dança,
vibração solar, seguir os rastros dos mouros que me interrogam até os ossos. Tenho
por este lugar a curiosidade desperta! Por ora, exponho meus contornos
brasileiros com sangue indígena, o apelo em aflição do peso da cruz cristã na
pele vermelha dos meus antepassados e o desejo de inventar no meu país, de
tristeza festiva, uma forma de vida enraizada na potência do encontro
ancestral.
Ficha técnica:
Realização: Núcleo de Performance da
Galeria Mezanino
Pesquisa, performance, figurino e
som: Luanna Jimenes
Orientação em dança: Sofia Neuparth e
centro em movimento
Orientação de pesquisa: Renato De
Cara
Apoios: Galeria Mezanino (Brasil),
Azeite Tojeira, Centro em Movimento, Associação Atalaia e Camara Municipal de
Ourique, Christian Olsen, Antony Raysenkov, Santa Casa de Misericórdia de
Ourique.
Afinação em performance: Graça Passos
Trabalho realizado no âmbito do
Programa de Residências Artisticas de Artes Performativas da Associação Atalaia
da Camara de Ourique